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Tendo em vista que cães e gatos fazem parte do ciclo de transmissão do Trypanosoma cruzi, causador da doença de Chagas, pesquisadores da Fiocruz Bahia, sob a coordenação do pesquisador Fred Luciano Neves Santos, realizaram uma revisão sistemática da literatura sobre a epidemiologia, os fatores clínicos, diagnóstico e tratamento da enfermidade em animais domésticos. A conclusão, baseada nos métodos de diagnósticos dos estudos revisados, aponta para a necessidade de uma ferramenta diagnóstica para detecção da doença de Chagas nesses animais. O trabalho foi publicado na revista Parasite & Vectors.
O estudo baseou-se na literatura produzida nos últimos 54 anos (1968 – 2022). Foram recuperadas 436 publicações acerca da doença, entre as quais foram considerados 84 estudos, obtidas por meio das plataformas PubMed, LILACS e do Scielo Brazil. Os resultados apontaram que os diferentes métodos de testes adotados fazem com que as prevalências de dados sorológicos variem em cada país, o que pode ser motivado às distintas taxas de risco de transmissão em cada período, ao tamanho da amostra usada nos testes ou até a variabilidade genética das cepas em circulação. Um dos estudos conduzidos no Brasil, por exemplo, teve variação da soroprevalecência de 0 a 53%, a depender da região analisada.
Os sinais clínicos da doença nos cães mudam de acordo com a idade do animal. Em filhotes é mais comum a manifestação de letargia, linfadenopatia, de maior demora na troca do pelo, palidez nas mucosas, e, em alguns casos, apresentam-se esplenomegalia e hepatomegalia. A partir dos seis meses de idade, no entanto, um dos sintomas mais comuns é a depressão leve. Já a infecção da doença em gatos não é tão amplamente estudada como em cachorros, permanecendo indistintos os fatores de risco de desenvolvimento da doença de Chagas nestes animais. No entanto, entre os achados da pesquisa, encontra-se uma maior suscetibilidade à infecção em felinos não domiciliados.
Nos estudos revisados, os testes usados foram produzidos com o fim de serem aplicados em humanos, e, posteriormente, adotados nos animais. Por vezes, esses exames não diagnosticam apropriadamente a doença por não atender às especificidades desses animais. De acordo com a pesquisa, estudos que empregaram proteínas quiméricas recombinantes demonstraram 100% de sensibilidade e 90.5% de especificidade no diagnóstico da Chagas crônica, independente da cepa ou expressão genética do parasita. Destaca-se o uso dos antígenos IBMP, desenvolvidos pelo Instituto de Biologia Molecular do Paraná, da Fiocruz, que demonstraram alta performance de aplicação em cães e baixa reatividade cruzada a outros anticorpos que podem estar presentes nos animais.
Para os pesquisadores, essa tecnologia pode ser a base de desenvolvimento de um teste comercial de detecção da exposição ao T. cruzi em cães e gatos, independentemente de sua localização geográfica. O desenvolvimento dessa ferramenta seria de grande importância para a saúde pública e a atuação veterinária.
Na América Latina e em algumas regiões dos Estados Unidos, animais domésticos são considerados os principais reservatórios do parasita T. cruzi. A infecção em animais ocorre por meio de contato com as fezes do inseto conhecido como barbeiro, de forma congênita ou através da ingestão de insetos infectados. Um levantamento, feito em 1996, estimou que cães contribuem 13.9 vezes mais do que humanos para a infestação do inseto em ambientes domésticos. Em outro estudo, os cães foram determinados como a fonte mais comum de sangue para o inseto transmissor (49% dos casos), seguido por gatos (39%), humanos (38%) e galinhas (29%).