O Instituto Brasil África (IBRAF) realizou, nos dias 22 e 23 de novembro, em Salvador (Bahia), o 6º Fórum Brasil África, que teve como tema “Empoderamento Juvenil: Transformação para Alcançar o Desenvolvimento Sustentável”. O evento reuniu representantes de governos, empresas, universidades e potenciais investidores e teve como objetivo fortalecer os laços e estimular novas parcerias entre os países africanos de língua portuguesa.
No primeiro dia, a presidente da Fiocruz, Nísia Trindade, integrou o painel “Cooperação Sul-Sul e Triangular para saúde e desenvolvimento” mediado pelo ex-ministro da Saúde e consultor da Unitaid, José Gomes Temporão. Além de Nísia, participaram do debate o diretor do Escritório das Nações Unidas para Cooperação Sul-Sul, Jorge Chediek, e o diretor de Relações Externas da Unitaid, Mauricio Cysne.
Nísia Trindade e João Bosco Monte, presidente do IBRAF, ao final do painel, lançaram uma iniciativa voltada para formação técnica, através da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Rio de Janeiro). O “Curso de Manutenção de Equipamentos de Laboratório de Patologia” será oferecido, na sede da Fiocruz, para jovens africanos pertencentes à Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP).
No segundo dia do Fórum, a Fiocruz organizou um Side Event, que consistiu em uma roda de conversa composta por representantes e especialistas de diferentes unidades da Fundação para discutir com os participantes estratégias e programas de parcerias internacionais.
A presidente da Fiocruz disse que um dos aspectos mais importantes do Fórum é ser um espaço de agregação entre representantes de vários países africanos e do Brasil, numa agenda ampla que envolve o desenvolvimento da saúde e educação. “Nós estamos no evento com foco específico na cooperação na área de saúde principalmente com os países africanos de língua oficial portuguesa. Esse contexto nos permite ver melhor a agenda inter setorial para correlação e cooperação com esses países”, comentou.
Durante o painel, Nísia Trindade agradeceu o convite para participar do Fórum, ressaltou como a colaboração Sul-Sul é fundamental para se pensar no desenvolvimento sustentável e abordou a questão das desigualdades. “Apenas um projeto político de superação poderia colocar em cena uma maior equidade entre os países. Recentemente, a agenda 2030 colocou também o desenvolvimento como direito humano e coloca a erradicação da pobreza, acentuando bastante a questão da extrema pobreza”, declarou.
Outro ponto destacado foi a agenda da Fiocruz de cooperação discutida a partir de um planejamento estratégico com a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa e colaborações com vários países africanos que falam outras línguas, como Benin e Nigéria. Nísia afirmou que a cooperação parte de uma visão estruturada em rede desses países, nos quais as instituições de saúde pública têm papel central.
José Temporão fez um desafio aos convidados colocando a questão do empoderamento da juventude como pretexto fundamental para o desenvolvimento sustentável. “De que maneira podemos pensar a Triangulação Sul-Sul para impactar positivamente o processo de empoderamento da juventude?”, indagou o mediador. Nísia mencionou o tripé educação, ciência e saúde como elementos fundamentais, tendo a Saúde como projeto civilizatório, com uma agenda construída com os jovens.
Capacitação de jovens africanos
De acordo com o presidente do IBRAF, a ideia de realizar uma parceria com a Fiocruz surgiu quando Nísia Trindade esteve no 5º Fórum Brasil-África, no ano passado. “A Fiocruz tem uma agenda absolutamente ampla nas suas ações, atuando em diversos lugares, inclusive no contexto africano. O que a gente pensa é que alguns programas que a Fiocruz já desenvolve, principalmente na área da capacitação técnica, possam ser apresentados para jovens africanos”, afirmou.
O curso de manutenção de equipamentos é realizado frequentemente pela EPSJV e já fez parte de outros processos de cooperação. “Somos muito gratos de dar a esses jovens a oportunidade de receber o ensinamento de uma instituição que pode trazer soluções objetivas para lugares que precisam de ajuda urgente. Espero que essa parceria anime outras instituições a virem até nós e dizer que também querem ser parceiras”, completou João Bosco.
Durante o Fórum, representantes da Fiocruz e do IBRAF se reuniram para discutir consensos preliminares para a estruturação do “Curso de Manutenção de Equipamentos de Laboratório de Patologia”. O projeto de cooperação entre as duas instituições integrará a oferta de cursos que compõem o Programa de Capacitação de Jovens Africanos, desenvolvido pelo instituto.
“A experiência indica que, apesar do curso ser formado com disciplinas específicas, deve-se estar atento à realidade desse outro país, já que estamos falando de um processo formativo”, explicou Ingrid D’Avilla, coordenadora do setor de Cooperação Internacional da EPSJV, voltada para a formação de técnicos em saúde. Para a coordenadora, esse tipo de curso pode desenvolver a estruturação dos sistemas públicos de saúde de modo a ampliar as capacidades dos serviços e, consequentemente, pela melhoria das necessidades de saúde da população.
Parcerias internacionais
Com foco na juventude, o Side Event promoveu o diálogo sobre a possibilidade de novos projetos e iniciativas em ciência, tecnologia e inovação em saúde. “Dentro do planejamento anual, a juventude é uma das prioridades da Fiocruz. Trabalhamos com a inserção do jovem na sociedade em relação ao processo de formação e atenção à saúde, além do trabalho de território”, relatou Valber Frutuoso, assessor de relações institucionais da Fiocruz e coordenador do Side Event.
Um projeto colaborativo entre Fiocruz, Centers for Disease Control and Prevention (CDC), Emory University (Atlanta, EUA), e nações africanas da CPLP, promove a saúde desses países por meio da criação ou fortalecimento de instituições análogas à Fiocruz voltadas para a saúde pública.
Augusto Paulo da Silva, do Centro de Relações Internacionais da Fiocruz, realiza o monitoramento do Plano Estratégico de Cooperação em Saúde da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Ele contou que a Fundação colabora para que esses países tenham instituições congêneres à Fiocruz. “Começamos esse exercício de criar ou fortalecer essas instituições para promover um desenvolvimento científico e tecnológico em saúde similar ao que temos na Fiocruz. Guiné-Bissau e Cabo Verde, por exemplo, possuem um novo instituto de saúde pública, com campus e laboratório próprios”.
Ainda de acordo com Augusto Paulo, a Fiocruz iniciou essas atividades antes do surto do Ebola, de forma que fomentou a preparação dessas nações para combater essa epidemia. “Para combater um evento público é necessário que existam institutos em saúde pública fortalecidos. Projetos verticais não são o suficiente para lidar com essas questões”, opina. Paulo Augusto indica que, no futuro, a Fiocruz desenvolverá junto com a União Africana o CDC Africa, que quer utilizar a experiência brasileira de criar instituições dentro dos moldes locais, em vez que importar um modelo estrangeiro.
A diretora do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz), Valdilea Gonçalves, apresentou os avanços das pesquisas em relação a Profilaxia Pré-Exposição, mais conhecido como PrEP. Trata-se de um grande programa que tem financiado o uso de PrEP como intervenção em populações chave, com alto risco de contrair o HIV, trabalho já realizado no México e no Peru. “Estamos interessados em aumentar a nossa colaboração Sul-Sul. Já iniciamos as discussões com Moçambique e estamos abertos a discutir planos e colaborações com outros países da África”, afirmou.
Outra experiência que está sendo levada para os outros países, é a de segurança alimentar e nutritiva. Fabiana Damásio, diretora da Fiocruz Brasília, abordou a experiência no ano passado em Moçambique. Foram promovidos dois cursos sobre segurança e governança alimentar para gerentes e técnicos em saúde. Este curso gerou a demanda no público e uma especialização para a área, com o objetivo de reduzir a má nutrição nessas nações. “Recentemente, desenvolvemos uma proposta para o plano local de redução da má nutrição nesses países, nos ministérios da saúde dessas nações, para desenvolver atividades no próximo ano. Tentamos agregar experiências do Brasil, que conseguiu sair do mapa da fome em 2014”, informou.
Para Pedro Burger, assessor de relações internacionais da Fiocruz, esse tipo de atividade reforça sistemas de saúde ao levar as experiências com o SUS, sobre a capacidade de vigilância e a luta contra a desigualdade econômica. “Participar deste tipo de evento tem dois objetivos: se fazer conhecer e atrair a atenção dos participantes de que estamos preparados para a cooperação internacional”, afirmou.
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