O XX Curso Internacional de Epidemiologia Molecular em Doenças Infecciosas e Parasitárias Emergentes (EPIMOL) foi realizado, após dois anos de atividades interrompidas por conta da pandemia de Covid-19, pelo Instituto Gonçalo Moniz (Fiocruz Bahia – IGM), entre os dias 13 e 26 de agosto de 2022. O curso, realizado em formato online, busca difundir os princípios e práticas da epidemiologia molecular aplicada ao estudo de doenças infecciosas e parasitárias. Outra meta do EPIMOL é contribuir para a capacitação e formação de profissionais da área de saúde e alunos de pós-graduação, respectivamente.
O EPIMOL reuniu alunos do Programa de Treinamento em Epidemiologia Aplicada aos Serviços do SUS (EpiSUS) e dos programas de pós-graduação em Biotecnologia em Saúde e Medicina Investigativa (PgBSMI), em Patologia Humana e Experimental (PgPAT), Rede Nordeste de Biotecnologia (Renorbio), em Farmácia (PPGFAR), pesquisadores e professores de instituições de pesquisa e universidades nacionais e internacionais. A realização desta edição contou com o apoio da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (SVS/MS), da Fiocruz Bahia – IGM, do Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos) e da Fundação de Apoio à Fiocruz (Fiotec).
Responsável pela coordenação do curso, em conjunto com o pesquisador da Fiocruz Bahia Luciano Kalabric e a professora titular da Universidade Federal da Bahia (UFBA) Joice Neves Pedreira, o pesquisador da Fiocruz Bahia, Mitermayer Reis, destaca o balanço positivo desses 20 anos de trajetória. “Nós temos várias avaliações de alunos egressos e são sempre muito positivas. O EPIMOL está sempre atualizado no que diz respeito aos desafios que a humanidade está passando”.
“É interessante que o curso começou com o privilégio de ter alunos que já eram professores titulares de outros universidades e institutos. Então, começamos a chamar atenção dos professores para que inscrevessem os alunos deles”, continua Mitermayer. “Começamos a estimular a participação de alunos que já eram servidores das três esferas de governo (federal, estadual e municipal). Hoje, vários servidores que fazem parte do quadro do Ministério da Saúde passaram pelo EPIMOL”, celebra, afirmando que também há egressos que atualmente ocupam cadeiras como professores em universidades.
Segundo a organização, aproximadamente 1.000 alunos foram participantes do curso e outros 500 foram ouvintes nessas duas décadas. “Vale destacar que tivermos participação de alunos brasileiros e da América Latina, África e Estados Unidos. Durante o processo seletivo, nós tivemos o cuidado de ter representatividade dos diferentes estados do Brasil. Reitero que o grande produto desse curso tem sido a contribuição na formação de pessoal nas áreas de saúde humana, animal e ambiente. Inclusive, nós entregamos ao final do EPIMOL, os materiais de aulas para que esse indivíduo seja um multiplicador em seus locais de origem”.
Luciano Kalabric, hoje organizador, foi aluno na primeira edição e, desde então, relata que pôde ver o curso estabelecer-se como referência. “O conteúdo é revisto para discutir os temas mais importantes do momento, como síndrome congênita causada pelo ZIKA e Covid-19, sem perder a essência que é fazer a ponte entre a Epidemiologia Clássica e o uso das ferramentas moleculares”.
O pesquisador reafirma a importância de atividades de internacionalização como esta. “O ambiente é fértil para a formação de colaborações nacionais e internacionais. Durante o EPIMOL, temos a oportunidade de qualificar pessoal que estão em diversos órgãos públicos de decisão, e que podem fazer a diferença para o SUS”, considera.
A professora Joice Neves, que participa da coordenação do curso desde 2004, discorre sobre o desafio que é organizar um evento como o EPIMOL, com a participação de especialistas de diferentes partes do mundo, e em diferentes fusos horários. Apesar disso, ela reforça o compromisso da organização em continuar promovendo esse espaço de formação. “Estamos sempre procurando adaptar o programa do curso às emergências de novas doenças infecciosas e ao surgimento de novas tecnologias e ferramentas”, garante. “A qualificação de recursos humanos voltados para o serviço público tem sido o nosso diferencial”.
No último dia do evento, foi realizada a sessão científica intitulada “Revisão Covid-19: Epidemiologia, Variantes e Vacinas”, ministrada pelo Especialista em C&T e Produção e Inovação em Saúde Pública da Fiocruz Mato Grosso do Sul, Julio Croda, que também é egresso do curso.
A avaliação dos professores
O EPIMOL é também uma proposta de união entre as áreas, comumente distantes, da epidemiologia clássica e a biologia molecular. Para Edson Moreira, pesquisador e professor da Pós-Graduação em Biotecnologia em Saúde e Medicina Investigativa (PgBSMI) da Fiocruz Bahia, essa conjunção faz parte dos méritos do evento. “A aproximação desses extremos faz com que vejamos o quanto podemos acrescentar de qualidade, mesmo que não nos tornemos especialista na outra área”, avalia.
Professor do curso desde sua primeira edição, Moreira expressa a satisfação que é participar de uma atividade que possui tanta relevância. “Observamos que, ao longo desses vinte anos, os egressos das primeiras turmas já fazem parte de alguns módulos e também de parcerias, colaborações com pesquisadores da nossa instituição. É uma alegria muito grande ver que esse curso, além de produzir investimentos, produz também resultados”.
Já Ronald Blanton, professor de Medicina e Doenças Tropicais na Universidade de Tulane (EUA), que esteve em 19 edições do curso, relata que a participação dos membros do EpiSUS suscita mudanças no perfil do EPIMOL e de como serão repassadas as técnicas laboratoriais. “O curso provoca o reconhecimento de que as ferramentas moleculares aumentam nossa habilidade de entender processos que, sem elas, permanecem escondidos. É a desmistificação dos métodos moleculares de um lado, e o papel da epidemiologia clássica do outro”, explica Blanton.
Felipe Naveca, pesquisador da Fiocruz Amazônia, ministrou a sua primeira aula do curso na terça-feira (23). “Foi emocionante ver como meu trabalho foi reconhecido como de excelência pelos ouvintes, já fui até convidado para o próximo EPIMOL”, conta. “Esse é um curso consolidado, com muitos anos de experiência. É um evento que reúne vários pesquisadores, então é uma grande oportunidade para os alunos aprenderem com quem faz sobre problemas práticos”.
A experiência dos discentes
Este ano o EPIMOL ofertou 60 vagas, metade oferecidas aos técnicos e profissionais da SVS e a outra metade para os estudantes de pós-graduação da Fiocruz e de outras instituições. As apresentações também foram disponibilizadas por meio de um webinário para ouvintes.
Camila Rodrigues Azevedo, nutricionista e integrante da 17ª coorte do EpiSUS Avançado, considera que a cooperação internacional que caracteriza o curso o diferencia. “Além de conhecer colegas de outros locais e com atuações diferentes, as aulas são ministradas por grandes pesquisadores da Saúde Pública”, considera. “Visualizar a epidemiologia molecular sendo utilizada na prática de investigações de surto foi muito interessante. As aulas com experiências exitosas durante a pandemia e com populações vulneráveis, como a população privada de liberdade, também me chamaram muita atenção”. A nutricionista compartilha que um dos pontos altos foi sua apresentação de uma investigação de surto realizada com outros colegas do EpiSUS – Avançado.
Em sua primeira experiência, o doutorando do Pós-Graduação em Biotecnologia em Saúde e Medicina Investigativa (PGBSMI) da Fiocruz Bahia, que desenvolve seu projeto na Fiocruz Ceará, Silvio Caetano Alves, declarou que o curso superou suas expectativas. “O senso crítico quanto aos casos e análises de dados foram primordiais para os meus primeiros passos. Mas, o que vou levar comigo é a certeza de que o principal é ter conhecimento e uma boa abordagem e que as ferramentas serão apoio para consolidação de bons resultados”, assegura.
“Quando soube deste Curso, fiquei animada, já que teria a oportunidade em aprimorar meus conhecimentos em diagnóstico molecular e epidemiologia, os quais estão presentes em minha caminhada profissional”, relata a também discente do PgBSMI Tycha Bianca Sabaini. Tendo concluído o doutorado em diagnóstico molecular pela Unicamp, Tycha afirma que a participação no EPIMOL é mais um passo em sua formação continuada. “Não posso deixar de mencionar sobre a proficiência dos professores que compõem a equipe técnica, os quais são de excelente formação e de fácil transmissão dos conhecimentos”, elogia.
Histórico
A primeira edição do EPIMOL ocorreu em 2001, por iniciativa dos cientistas Mitermayer Reis e de Lee W. Riley, professor da Universidade da Califórnia, que baseou o curso em uma disciplina que ele ministrava. O EPIMOL sempre foi realizado no Instituto Gonçalo Moniz, e inspirou outras versões levadas pelos pesquisadores ao Paraguai e a Portugal e no Rio de Janeiro, este feito em parceria entre a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e a Universidade Federal Fluminense (UFF). A organização conjectura realizar a próxima versão do curso em conjunto com o Congresso de Medicina Tropical, realizado em Salvador, possivelmente em setembro.
O EPIMOL iniciou com foco em doenças infecciosas e bacterianas, seguindo pelas arboviroses, como a Zika e a chikungunya, pela Influenza e, neste ano, a atenção foi dedicada ao Covid-19. Segundo Mitermayer Reis, o curso ainda se volta ao estudo da resistência antimicrobiana, classificada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), em 2017, como o maior desafio da humanidade.
Este ano participaram pesquisadores da Fiocruz Bahia e da unidade da Amazônia, da Universidade da Califórnia (UC), Universidade de Yale, Universidade de Tulane, Universidade Stanford, da UFBA, Universidade de Brasília (UnB), Universidade Estadual da Bahia (UNEB), Universidade Federal do Recôncavo Baiano (UFRB), Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública (EBMSP) e da Universidade Salvador (UNIFACS).
O EPIMOL é uma disciplina obrigatória para os alunos da PGBSMI. Com o tempo, o curso passou a ser integrado ao ensino de outros cursos de pós-graduação e os créditos de participação no evento podem ser reaproveitados pelos discentes.