Novo coronavírus circulou semanas antes de ser detectado na Europa e nas Américas, sugere estudo

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O pesquisador da Fiocruz Bahia, Tiago Gräf, realizou a análise do “relógio molecular” do vírus.

O pesquisador da Fiocruz Bahia, Tiago Gräf, participou de um estudo recente que estima a circulação do novo coronavírus por semanas antes dos primeiros casos serem confirmados em países da Europa e das Américas. A pesquisa utilizou metodologia estatística de inferência a partir dos registros de óbitos.

O grupo de cientistas, liderado pelo pesquisador do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), Gonzalo Bello, juntou seus conhecimentos em metodologias de análise de evolução de vírus e epidemiologia molecular para colaborar na pandemia de covid-19. O estudo está em revisão na revista “Memórias do Instituto Oswaldo Cruz” e está disponível no formato de preprint.

Toda a equipe tem larga experiência em pesquisas aplicadas ao entendimento da história evolutiva e padrões de dispersão de surtos e epidemias, tendo realizado estudos com técnicas baseadas em análise genética para HIV, hepatites, dengue, Zika e febre amarela, entre outros agravos.

Dados do trabalho indicam que o novo coronavírus começou a se espalhar no Brasil por volta da primeira semana de fevereiro. Ou seja, mais de 20 dias antes do primeiro caso ser diagnosticado em um viajante que retornou da Itália para São Paulo, em 26 de fevereiro, e quase 40 dias antes das primeiras confirmações oficiais de transmissão comunitária, em 13 de março.

Na Europa, o estudo aponta que a circulação do vírus pode ter começado aproximadamente em meados de janeiro na Itália e entre final de janeiro e início de fevereiro, na Bélgica, França, Alemanha, Holanda, Espanha e Reino Unido. O começo de fevereiro também foi o período de início da disseminação na cidade de Nova York, nos Estados Unidos.

A pesquisa é a primeira a apontar o período de início da transmissão comunitária no Brasil e reforça evidências preliminares de pesquisas conduzidas na Europa. Corrobora ainda achados de estudos realizados nos Estados Unidos, que a partir de análises genéticas indicaram começo da propagação viral na cidade de Nova Iorque entre 29 de janeiro e 26 de fevereiro.

Metodologia e Resultados

Uma vez que a carência de testes de diagnóstico e o grande percentual de infecções assintomáticas dificultam a contagem de casos da doença, os registros de óbito são considerados as informações mais confiáveis sobre o progresso da epidemia, podendo ser utilizados como um rastreador “atrasado”, que permite observar o curso da doença de forma retrospectiva. Por o vírus causar muitas infecções assintomáticas, é difícil rastrear o início da transmissão comunitária, ou seja, o vírus poderia estar se disseminando “silenciosamente” muito antes do primeiro caso ser diagnosticado.

No trabalho, Tiago Gräf realizou a análise do “relógio molecular” do vírus, um método de análise dos genomas que relaciona o número de mutações observadas nas sequências de seu DNA com o tempo de circulação do vírus na população. Os resultados dessa análise foram comparados com as análises estatísticas de óbitos para validação do método utilizado no estudo.

Segundo o pesquisador, um problema enfrentado para se entender a história da dispersão da covid-19 no mundo é a escassez de genomas do vírus em alguns países, incluindo o Brasil. Além disso, devido a sua recente circulação entre humanos, o vírus é muito similar em todas as regiões do mundo, dificultando a utilização das análises de “relógio molecular”. Foi por isso que os pesquisadores aplicaram uma nova abordagem para estimar o início da transmissão comunitária da covid-19, utilizando os registros de óbitos.

Apesar do estudo estimar datas próximas para o início da transmissão comunitária do vírus em diferentes países, a expansão da epidemia em cada localidade parece ter seguido uma dinâmica própria. “Muito provavelmente, a dinâmica de expansão da epidemia foi definida por fatores locais, como características ambientais de temperatura, precipitação e poluição do ar, densidade e demografia da população”, comenta Tiago Gräf.

Os resultados do estudo sugerem a importância de maior vigilância por parte dos sistemas de saúde e a intensificação do diagnóstico na reemergência do vírus, enquanto não for desenvolvida uma vacina para a doença. “Para os próximos anos, é muito importante ficarmos vigilantes para serem aplicadas medidas de distanciamento social e quarentena de uma forma muito rápida”, acrescenta o pesquisador.

O estudo foi realizado pelo Laboratório de AIDS e Imunologia Molecular do IOC/Fiocruz em parceria com Fiocruz Bahia, Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e Universidade da República (Udelar), no Uruguai. Os resultados foram publicados na seção ‘Fast Track’ da revista científica ‘Memórias do Instituto Oswaldo Cruz’, que permite a divulgação acelerada de pesquisas relacionadas à pandemia.

*Com informações do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz)

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